domingo, 31 de janeiro de 2016

Sven e a Velha Estalajadeira

   

Olá, aventureiros!

   Quando estou escrevendo as crônicas da companhia, uma das coisas mais difíceis de se adaptar, sem dúvida, é o número insano de piadas que são ditas durante as sessões. Muitas das vezes, são essas piadas que fazem as seções memoráveis, e também que criam a necessidade de longas pausas para descansarmos os músculos das bochechas (os alteregos de Sven e Thomas que o digam - não é sem motivo que eu vejo ambos se tornando os "alívios cômicos" da Companhia aqui no blog).

   No entanto, existem uma infinidade de piadas e situações que não podem ser transcritas aqui no blog, por n razões. A maioria é fora de contexto demais, envolvendo metajogo (piadas com elementos do mundo real, inexistentes no contexto do jogo); existem aquelas bobas demais (estou olhando pra você, Aleena) e existem algumas, ótimas, que infelizmente ficam de fora por saírem demais do tom que estou tentando passar num determinado capítulo.

   Um exemplo de situação cômica que acabou ficando de fora foi o que aconteceu com Sven depois que ele saiu da taverna (lá no Capítulo 2). Sven estava em um período de autoflagelação, e ficou bem irritado com os seus companheiros por os darem bebida, enganado. Chegou então a uma hospedaria lotada ("A Âncora Enferrujada") e deu de cara com a estalajadeira, uma velhota encarquilhada.
   "Gostaria de um quarto individual, senhora estalajadeira" disse Sven.
   "Claro, mestre anão! No sótão, temos um quarto sobrando." sorriu a velhota. "Estamos servindo um belo caldo de peixe hoje, nossa espcialidade."
   Se sentindo recluso, Sven disse:
   "Gostaria que fosse servido no meu quarto, se não houver problema."
   Decidi que, apesar do movimento de clientes, a velha se permitiu uma gentileza:
   "Claro, mestre anão, claro. Algo mais?"
   "Sim" continuou Sven, pensando em sua autopunição por desobedecer a própria promessa de não beber álcool "Gostaria de uma vela, uma faca e um pedaço de corda, se for possível."
   Achei estranho e imaginei a resposta da velha, mas Sven estava tão imerso em sua interpretação que decidi ver aonde ia essa loucura.
   "Er, sim, senhor. Posso providenciar."
   "Gostaria disso tudo em pelo menos um minuto, lá em cima, tudo bem?"
   Foi aí que decidi que Sven tinha ido longe demais. Usando minha melhor voz de Monty Python imitando uma mulher, pus-me a gritar, reclamando:
   "Ah, só isso? Em menos de um minuto? A hospedaria está cheia de gente, e você quer comida no quarto e um monte de bugigangas malucas! Sou só eu e meu neto cuidando desse lugar, moço! Que mais vai querer agora, um botão de camisa, três bigodes de rato e o meu sutiã? Você tá achando que é quem, o Bruce Springsteen?"
   
   As gargalhadas foram tantas que gastamos quinze minutos antes de conseguirmos voltar ao jogo.

   E não, Aleena, responder "Baixo!" quando algum guarda fala "Alto!" não é uma boa piada e não vai parar nas crônicas.

O Mestre

Capítulo 4 - Duque Artim Daven III

Fonte: museicivicifiorentini.comune.fi.it

   A sala de audiências do Duque não era menos impressionante do que o resto do castelo. Retangular, o piso formava uma escadaria de degraus rasos e que deixava o cadeirão decorado de madeira do Duque ligeiramente acima dos peticionários. As paredes atrás da cadeira possuíam janelas muito altas, ladeadas por flâmulas com o brasão dos Daven. As paredes laterais eram ocupadas por algumas estantes de livros e armários, e também existia uma segunda porta que dava acesso à sala, menor e mais discreta do que aquela pela qual o trio entrara.
   Contaram seis guardas: quatro ladeando a porta de entrada, próximos ao grupo, e mais dois na outra porta. Um deles anunciou, batendo a alabarda no chão:
   - Duque Artim Daven III, Senhor de Mohrstarr e do Ducado de Daven!
   O Duque estava sentado em sua cadeira, com uma expressão impassiva. Era jovem, não muito mais que trinta anos; tinha cabelos loiros cortados curtos, assim como uma barba escanhoada. Era um homem atlético, e tinha um semblante que expirava controle e confiança. Encostada à sua direita estava uma espada decorada, dentro da bainha; à sua esquerda ficava uma pequena mesa em que repousavam uma jarra e um cálice de prata.
   Sem saber direito como se comportar, Drake abaixou-se numa reverência. Aleena fez uma meia-mesura, contida; Sven encarava o Duque abertamente. Por fim, o Duque anunciou:
   - Saudações. Quem são vocês e o que vêm pedir de mim?
   - Somos membros da Companhia Inconsequente e trazemos algo que pertence ao senhor, senhor Duque - Drake adiantou-se. Estava nervoso e suava frio. Aleena deu um passo à frente e, lentamente, desembrulhou o fardo que trazia, revelando a espada dourada. A expressão do Duque congelou.

quinta-feira, 28 de janeiro de 2016

Capítulo 3 - A Fortaleza de Sidar

   Com um jato de água fria, Thomas acordou, tossindo e cuspindo. Se viu no chão d´O Leviatã; uma jovem rechonchuda de cabelos cor-de-mel o encarava, com um balde vazio nas mãos.
   - Desculpe, senhor, - gaguejou a menina - mas estamos fechando.
   Tom se sentou. Tinha um gosto metálico horrível na boca, e sentia um cheiro asqueroso. Piscou várias vezes e lavou os olhos com a água que escorria de sua cabeça. Por fim, levantou-se, gemendo horrivelmente no processo. A menina se prontificou para ajudar:
   - Aqui, vovô, se apoie em mim...
   - Por que todo mundo me chama de "velho" ou "vovô"?  Sombras e espectros, eu tenho só cinquenta anos!
   - Desculpe, senhor, não quis insultá-lo...
   - Tudo bem. Ai! - apalpou o nariz, e se arrependeu; a ponte doía muito ao toque - Está quebrado, não está?
   A menina fez que sim com a cabeça. Pela sua expressão, Tom imaginou que não estava nada bonito.
   - Tudo bem, menina... quanto eu devo o seu patrão?
   - Nada, senhor - respondeu o taverneiro desdentado, aparecendo com olhos fundos e um sorriso cansado - Sua amiga ruiva pagou sua conta. Deu um belo espetáculo, aquela lá.
   - O que... o que aconteceu? Eu me lembro de tão pouco... - sua cabeça doía; mais uma fonte de dor para sua coleção.
   - Bom... - o taverneiro coçou o queixo - deixe-me ver... depois que aqueles marinheiros de Nahros bateram em você, ela apareceu do nada e acabou com eles. Quebrou um braço e vários dentes, ela. É difícil ver uma mulher que luta daquele jeito. Espantoso.
   Tom engoliu em seco. A cena era perfeitamente plausível em sua cabeça.
   - Então todo mundo começou a ovacioná-la e comprar cervejas pra ela... e ela disse que quem tocasse em você ia perder as duas mãos e o... enfim, foi uma bela ameaça. Ninguém tocou em você a noite toda, mas ela esqueceu de te levar. Estava bem bêbada. Todos estão sempre, aqui. Mas agora tenho que fechar, então... por gentileza, já que estamos quites, eu tenho que limpar o local.
   - Pois não... mil perdões pelo incidente, senhor taverneiro.
   - Eu tenho uma taverna de marinheiros no maior porto do norte. - respondeu o homem, sorrindo - Qualquer dia em que ninguém se espanca é um dia estranho.
   Thomas agradeceu mais uma vez e saiu pela porta de entrada. A luz do sol nascente feriu seus olhos, e ele xingou em fenardien enquanto protegia o rosto. Tentou usar sua magia espiritual para consertar o estrago inchado que era seu nariz, mas falhou: talvez por ainda estar meio bêbado, ou talvez pela falta da costumeira comunhão espiritual que fazia todas as manhãs.

segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

Feed!

Olá, aventureiros! Como vão?

   Atendendo a pedidos, disponibilizamos o link para nosso Feed RSS, para que vocês possam estar sempre atualizados quando novas postagens saem. Ainda vamos resolver o feed pra mobile (em breve, prometo).
   Vocês podem acessar o o Feed aqui ou ali em cima, à direita.
   Agradeçam ao alter-ego de Drake Krowsey pela ajuda.
   Fiquem ligados nas atualizações!

O Mestre

Capítulo 2 - O Porto da Prata


Fonte: http://www.skyscrapercity.com

   O grupo se encarou, embaraçado demais para admitir ao soldado que um rapazote, ainda mal saído dos cueiros, era o responsável por guiar o barco. Thomas teve uma solução:
   - Nós somos uma tripulação democrática, meu bom homem. Somos todos responsáveis pela nau - anunciou, com um sorriso franco.
   - Filosofia digna de um fenardien, sem dúvida, senhor marinheiro. Mas alguém deve assinar a carta-contrato dos serviços portuários, - bateu com uma pena na prancheta que carregava debaixo do braço - e eu vou precisar conferir a sua carta-ingresso também, por favor. A que foi dada a vocês nas muralhas interiores.
   Darsh se adiantou, pegando a carta da mão de Drake.
   - Aqui, senhor... como é mesmo seu nome?
   - Capitão John da Guarda do Porto - respondeu o homem, distraído, enquanto lia a carta-ingresso sob a luz da lanterna a óleo que carregava - Aqui diz "Barco de Passeio". Isso está certo?
   - Sim, senhor.
   - Este é um barco de incursões kortlani, não é? Um dracar. Um barco de guerra. E vocês não me parecem estar apenas dando uma volta pela baía - o olhar de John se demorou sobre as armas presas no cinto de Aleena, o martelo na mão de Sven e as demais armas que descansavam no barco.
   O grupo parecia um tanto sem jeito. Drake pulou para a amurada, se juntando a Darsh.

sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

Desambiguações Portuárias

   Olá, aventureiros!
   Narrando a última sessão, em Morhstar, eu me deparei com uma antiga dúvida: qual a diferença entre porto, cais, estaleiro e doca? Pode ser bobeira pra muita gente, mas quase ninguém conseguiu definir na hora. Então, a título de curiosidade, decidi colocar aqui as definições e imagens desses lugares e construções portuárias.

Porto da Cidade do Porto, Portugal.
Fonte:blog.gobybike.eu 

   Um Porto é o local geográfico de uma cidade, com acesso ao mar (ou outro corpo d'água), onde barcos aportam (duh) para carga e descarga. É uma região ampla e não se limita apenas às praias e enseadas, normalmente incluindo uma boa parte da cidade em que se localizam.

Fonte: www.refugiodeumsonhador.com.br


    Um Cais é uma estrutura, normalmente construída num porto, composta de plataformas sustentadas por palafitas, onde barcos grandes e pequenos são amarrados. Servem pra que os tripulantes possam acessar terra firme sem que os barcos precisem ser encalhados.

Capítulo 1 - Morhstarr, a Estrela do Norte

Fonte: casperartvikingar.blogspot.com
   Sentado em seu canto, na proa do dracar, Dûr Sven suspirou. A ausência de seu companheiro, o elfo, que os deixara na manhã daquele mesmo dia, se fazia sentir no silêncio opressor que caía sobre o barco da Companhia. Os pequenos acordes tocados no alaúde de Amakiir faziam tanta falta que o clima entre os companheiros era comparável ao de um funeral.
   Os últimos raios de sol tingiam o Mar Branco com uma luminosidade âmbar. O fim do dia de outono trouxera uma brisa gelada que enchia a vela do barco e, inusitadamente, possibilitara aos tripulantes um descanso do serviço de remar, e eles agora se ocupavam de cuidar de seus próprios interesses. Darsh, o meio-orc, gastara vários minutos tentando pescar algo no barco em movimento, usando apenas uma linha e um anzol que ele mesmo produzira usando um encanto simples; ao constatar seu insucesso, foi para o fundo do barco, resmungando, e pôs-se a ler um velho tomo. Drake brincava de acertar a adaga entre os dedos, na amurada do barco, produzindo um toc-toc-toc constante. O velho Tom, por sua vez, mexia num asqueroso monte de algas, conchas e madeira podre de naufrágio, murmurando algumas palavras estranhas (para o crescente descontentamento de Aleena, que tentava tirar um cochilo a poucos centímetros de distância).
   - Você tem que fazer isso aqui? -  Rosnou a kortlani, cobrindo os olhos com um capuz de pele de bode.
   - Calma, senhorita Aleena. Você já vai ver o que isso aqui é...
   Aleena bufou de dentro do capuz. Drake, sem tirar os olhos da faca, respondeu.
   - Eu sei o que isso aí é. É uma monte de merda fedorenta.

quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

Bem-vindos à Companhia!


Antes de começar a contar as histórias da Companhia Inconsequente, é válido fazer uma breve introdução sobre seus membros atuais (e vivos). São eles:

Aleena Fogo-Vivo:  humana criada entre os saqueadores das ilhas de Kortlan, Aleena foi afastadada família ainda jovem, e aprendeu com o mestre-de-armas real a manejar espada, machado, escudo e lança; Aleena sempre preferiu cotas-de-malha a vestidos caros. Seu apelido vem tanto de seus cabelos cor-de-fogo quanto de sua fúria em batalha. Aleena tinha um irmão, Krug, que fez parte da Companhia por um breve período, apenas pra ser aniquilado por uma horda de goblins durante uma das aventuras do grupo. A guerreira é sisuda e mal-humorada, e nada pode pará-la quando ela decide que sua espada deve separar uma cabeça de seu respectivo pescoço.

Dûr Sven: anão, nascido em Kortlan, numa ilha isolada, trabalhou por vários anos como minerador, até que sua ilha foi invadida por um poderoso lich (um bruxo morto-vivo).

quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

Vocês estão numa taverna, e então...


...acessam um novo blog. Com um nome estranho, contando histórias fantásticas sobre personagens bravos, heroicos, meio malucos e... inconsequentes.
  A ideia de criar esse blog nasceu num dos maiores berços de criatividade que o ser humano inventou: uma mesa de RPG (mais especificamente, Dungeons & Dragons 3.5). Jogando já há mais de um ano, com personagens de jogadores indo e vindo, nascendo na ponta do lápis e morrendo nos críticos do meu d20, eu decidi, há bastante tempo, manter um sistema complexo de diários de campanha: registros sobre locais, PdMs (ou NPCs, para os jogadores mais recentes), linha de história do grupo do mundo em que eles habitam. Não seguindo nenhum cenário publicado, eu uni a minha criatividade incessante ao meu transtorno obsessivo-compulsivo por ter uma história coesa e o mais realista possível, o que torna meu trabalho como Mestre (ou DM, como preferirem) três vezes mais longo do que o já enfadonho esforço habitual do "cargo".
  Todo bom Mestre tem um sonho simples: que a história criada na mesa renda frutos futuros além de uma sessão divertida. Alguns publicam as aventuras e campanhas para uso por outros Mestres; outros publicam monstros, classes e cenários personalizados; os mais ambiciosos tentam romantizar sua campanha e escrever livros de fantasia sobre ela. Não é um sonho impossível - assim nasceu o esplêndido A Batalha do Apocalipse, do autor brasileiro Eduardo Spohr. Não vou mentir: quando comecei a mestrar essa campanha em 2014, tinha ambições que ela me rendesse um romance. No entanto, romantizar uma aventura de RPG é um trabalho titânico: em parte pelo próprio processo de escrita, e em parte em adaptar as maluquices que nós mestres e, principalmente, nossos insanos jogadores, aprontam na mesa; muitas vezes ações que se tornariam ridículas - ou então entediantes - se não forem editadas na mente de um competente romancista.